terça-feira, 12 de maio de 2009

“O anjo da tempestade” de Nuno Júdice


Logo como primeira impressão, sobressai a forma exímia que o autor revela no domínio das técnicas de bem escrever. Inquestionável, creio.

Contudo, à medida que se progride na leitura, o autor vai desenvolvendo uma trama de tal forma intrincada em que as ideias se enredam nas conjecturas, o passado se mistura com o presente e com outros passados e outros presentes; o deslindar de um hipotético homicídio (premissa inicial do livro) se interliga com as lutas de classes travadas em consequência de ideologias propagadas por livros como “O Capital” de Karl Marx (contemporâneo da personagem supostamente assassinada); a noiva “viúva” se confunde com a explicadora de francês, por sua vez, virtuosa tocadora de piano que pode muito bem ser também Isabelle d”Este de Ticiano ou a bela Rosina de Antoine Wiertz...

Enfim, torna-se um pouco difícil para o leitor (pelo menos para mim tornou-se), seguir o fio do raciocínio através das miríades de voltas e contravoltas do enredo, do autêntico tumulto de assuntos que o autor esgrime, com grande mestria, repita-se, sem nunca se perder naquele alucinante desencadear de ideias.

Dado que esta leitora não possui semelhante mestria, nem nada que se aproxime, decide dexar-se levar por esse nunca acabar de deambulações cujo ponto comum é, embora por vezes bem fugaz, esse antepassado assassinado, ou desaparecido, ou fugido; ou vítima da luta de classes, ou de um meteóro, ou da mão divina, quem sabe..., e consegue, por fim, usufruir do excelente texto e apreciar trechos de grande beleza em que a verdadeira personagem é o próprio autor.

Livro a ler, de mente completamente aberta, a acompanhar o autor/personagem enquanto este se compraz nas suas deambulações e vai evoluindo ao sabor da sua vontade, através dos espaços, do tempo, das emoções.

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