terça-feira, 30 de junho de 2009

“O amor não espera à porta” de Marisa de los Santos


Mais um que acabei de ler e já me aguardava há algum tempo.

Devo dizer que o achei de leitura interessante e agradável dando vontade de a prosseguir quase continuadamente.

Com um estilo de escrita que posso considerar original, desde logo prende a atenção do leitor.

Escrito na primeira pessoa, por duas personagens, vai-nos dando visões sucessivas da história. Ora através de um adulto, ora através de uma criança.

A história, sem dúvida uma história de amor nas suas diversas vertentes (romântico, familiar, amizade…), passa por momentos de verdadeiro drama que só a sageza da autora no aligeirar da sua abordagem, evita que o livro adquira contornos exageradamente dramáticos.

Para tal a autora utiliza recursos tais como referências constantes a filmes, a actores de cinema, a momentos desses filmes, para ilustrar situações, emoções, sentimentos, bem como o diálogo jocoso da personagem consigo própria…

Quanto a mim, peca apenas pelo excesso dessas alusões relativas ao cinema, bem como pela atitude, exageradamente adulta, que a personagem criança revela em várias situações; muito forçadas no meu ponto de vista.

Contudo, livro a ler.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

“A solidão dos números primos” de Paolo Giordano


Qualquer razão é boa para que eu compre um livro. Desta vez foi a idade do autor, 28 anos, e o facto de ter ganho o prémio Strega 2008 e uma menção honrosa, também na edição de 2008, do prémio Campiello duas das mais importantes distinções literárias em Itália, segundo creio.

Por outro lado achei interessante o título que, aliado à sinopse, parecia fazer todo o sentido apesar de eu ser muito mais das letra do que das matemáticas. Ao contrário do autor, já agora, que sendo licenciado em Física pela Universidade de Turim e estando a fazer um doutoramento em Física de Partículas, tão bem se entende com essas, também partículas, que são as palavras.

Gostei muito do livro.

Escrito com simplicidade (não de forma simplista) é de uma profundidade na análise da pessoa humana sobretudo naquilo que diz respeito ao aspecto relacional absolutamente sublime.

O enredo centra-se essencialmente em duas personagens: Mattia e Alice. Cada um, de forma diferente, sofreu um percalço na sua vida que o tornou (não o seriam já?) diferente das outras pessoas; distante delas… Tal como os números primos que são os mais isolados de todos sendo divisíveis apenas por si próprios e por um. Contudo, estranhamente (ou não), vão surgindo ao longo da numeração, sempre em grupos de dois com alguma proximidade e cito “por pouco se tocam, são primos gémeos… mas igualmente sós”.

Há lá maneira mais exacta e contudo mais poética, mais bonita, de descrever a solidão daqueles que são diferentes e, como tal, quase se tocam, quase se amam, quase se entendem, quase… mas permanecem eternamente sós.

Definitivamente a ler. Espero o próximo.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

“O Ano de 1993” de José Saramago


Li hoje o livro referido que foi para mim uma enorme surpresa. É um livro relativamente pequeno, tem 120 páginas, uma boa parte ocupada com belíssimas ilustrações de Rogério Ribeiro. É um livro lindíssimo em todos os aspectos.

Quando me refiro ao facto de ter constituído uma surpresa, tenho de mencionar alguns aspectos. É o primeiro livro de Saramago que leio neste formato algo dúbio em termos de classificação formal.

Trata-se de poesia?

Pode ser uma vez que a sua escrita está organizada em forma versicular. Além disso utiliza abundantemente, para se exprimir, a metáfora, a alusão a um a realidade que apenas a poesia contempla e o poeta sabe descrever, a evocação, a alegoria…

Contudo, é um livro narrativo pois há uma história que se desenrola perante os nossos olhos e se vai adensando até atingir um ponto alto, o seu clímax.

Essa “narrativa” é, na minha opinião, nitidamente do âmbito da ficção científica, mesmo profética. Talvez até, quem sabe, com alguma influência de George Orwell e o seu “1948”…

Julgo que em alguns momentos podemos encontrar laivos de crónica. Aqui e ali um tom algo doutrinário e, talvez subjacente, uma tendência edificante. É subtil, mas está lá.

Bom, passemos a classificação formal, para mim o menos importante mas agradável de analisar, e ficamos com o quê?

Com um livro altamente alegórico, fantasmagórico até, através do qual podemos inferir que trata de formas de opressão, de resistência lúcida a essa opressão, e também de alguma pedagogia política.

Mas podemos também ignorar isso tudo e deliciarmo-nos apenas com páginas estupendas de uma escrita perturbadora, enigmática e fascinante e apreciar tão-somente a beleza das palavras.

Ou seja: é um livro que nos leva a vacilar na sua interpretação pela quantidade de caminhos que nos deixa em aberto.

domingo, 14 de junho de 2009

“Casos do Beco das Sardinheiras “ de Mário de Carvalho


Ontem, nas viagens de metro que me levaram e trouxeram de um evento lindíssimo de homenagem a Fernando Pessoa (nasceu a 13 de Junho dia em que se comemora o Santo António embora não seja certa a data de nascimento de Fernando de Bulhões), li o livro “Casos do beco das Sardinheiras”.

Não podia ser mais a propósito. Em dia de Santo António, Mário de Carvalho presenteou-me, na sua escrita de tal modo versátil que é difícil de caracterizar, com um conjunto de episódios passados no tal Beco que se situa, não se sabe muito bem, se ainda em Alfama se já na Mouraria.

Com um tipo de escrita muito bem-humorada vai desenrolando episódios no mínimo insólitos e efabulados (escanifobéticos!) que vão ocorrendo naquele Beco com as suas gentes.
Utiliza para tal a linguagem típica e picaresca dos habitantes do bairro, eles próprios fruto de uma colorida imaginação mas que contêm na sua génese as características próprias dos naturais de um bairro típico lisboeta.

Gostei muito. De leitura fácil, é, no entanto, muito agradável e, literáriamente de qualidade.


Curioso o epílogo em que o autor, enquanto autor, recebe em sua casa uma delegação de moradores do Beco pedindo-lhe para continuar a contar os muitos episódios que faltam ainda.


E aqui o autor responde: “ – Meus caros, vejam lá se compreendem uma coisa. Um autor tem que se defender, estão a perceber? Eu cá fiz estas histórias porque simpatizo convosco, mas não podem exigir-me muito mais……… É que isto da literatura, meus amigos, tem os seus pergaminhos, a sua dignidade: A-dignidade-do-discurso-literário. …. Sabem o que ganho com isto, sabem? Pois bem: vão-me chamar um escritor menor, vão-me acusar de estar para aqui a fazer literatura de miuçalha, de facilidade, de pechisbeque, de cutiliquê, literatura patchuli, literatura pataqueira, hã? E se calhar até lhes dou razão. Só que eu não tenho culpa que vocês me tenham assaltado os sonhos…”


Interessante, não? Este descritivo dos tipos literários. Esta divisão entre literatura maior ou menor conforme o tema que nos assalta os sonhos…

“A Maldição - Duma Key” de Stephen King


Mais um livro de Stephen King, autor do género thriller/terror que bastante aprecio. É talvez o 4º ou 5º que escreveu (que eu me tenha apercebido) depois de anunciar que iria deixar de escrever após ter sofrido um grave acidente que o deixou bastante mal.

Está visto que recuperou pois readquiriu também a sua capacidade produtiva. Desta vez trata-se de “A Maldição - Duma Key”.

É mais um livro que segue o registo a que o autor nos habituou desde sempre (com algumas incursões não tão bem sucedidas por outros géneros no entretanto), o thriller/terror com uma grande componente emocional.

Claro que com tamanha produção, tem necessariamente uns melhores outros piores. Na minha opinião este encontrar-se-á numa linha média de qualidade.

Comecei por lhe notar alguma diferença em relação à grande maioria dos que havia lido. Uma primeira parte, bem grande, possivelmente o correspondente aproximadamente a 2/3 do livro, um pouco mais calma e mais centrada no tratamento das personagens. Não sem que entretanto uma delas, a principal, tenha sofrido um gravíssimo acidente que quase o mata, que vem a provocar-lhe acessos de fúria que trazem como consequência o divórcio e a sua deslocação para uma zona calma, junto do Golfo do México, onde fará a sua recuperação. Como se vê, nada que não possa suceder num argumento até romântico. Contudo, o autor vai introduzindo pequenos apontamentos por si só quase insignificantes mas que vão induzindo no leitor aquela sensação de que algo não está bem.

E realmente não está. Edgar Freemantle que entretanto se havia dedicado à pintura, produzindo quadros de grande qualidade apercebe-se de estranhos poderes e influências que esses quadros possuem.

Assiste-se assim, mais para o final do livro a um aumento do ritmo narrativo no qual se repete um ciclo alucinante de acontecimentos que, segundo se percebe, haviam já tido lugar há uns anos atrás. E aí Edgar, Wireman e Jack, amigos que ele tinha criado entretanto, vêem-se envolvidos num turbilhão de acontecimentos que têm tanto de incrível como de assustador.

O final torna-se algo fantasmagórico e alucinante. Mas, a verdade, é que não apetece fechar o livro. Apetece ler sempre mais um pouquinho…

É este o registo em que o autor é, de facto, mestre.

Para quem gosta do género, sem dúvida a ler.