E se valeu a pena!
José Eduardo Agualusa, desenvolve neste seu livro, com invulgar talento mesmo para quem conhece um pouco da sua obra, uma história fantástica.
Fantástica pelo seu enredo que não é bem um enredo mas sim um conjunto de pequenas histórias, algumas de natureza étnica e tradicional, que suportam e estruturam a história “maior”. Fantástica pelo recurso ao fantástico, ao onírico, ao esoterismo, a anjos negros…
Tudo se vai passando numa Luanda do ano 2020. Mas ao lermos, vamos ficando com a ideia que é da Luanda de hoje que se trata, ou um decalque desta; anárquica, contraditória, corrupta, terra de contrastes e de paradoxos, onde coexistem o sonho e o desesperança com a mais despudorada realidade. A Luanda que todos julgamos saber (falta de confiança do autor?).
Utiliza uma escrita simples se bem que, por vezes, utiliza recursos linguísticos “barrocos” como a antítese, o oximoro, a hipérbole e a metáfora. Mas, quando o faz, quase sempre utiliza um parêntesis justificativo, como autor. Aliás utiliza parêntesis explicativo em várias situações e com funções diversas. Um recurso deveras interessante.
As personagens são várias e variadas e são-nos apresentadas uma a uma no início com a respectiva importância na história.
Todas extremamente bem caracterizadas, sobretudo as de maior relevância para o desenvolvimento e desfecho da narrativa. E temos modelos, prostitutas, cantoras, pessoas sem rosto que usam uma máscara, ministros, militares, curandeiros de grande influência e um escritor (quiçá um pouco o alter-ego de Agualusa?) que é ao mesmo tempo a personagem principal e o narrador. Esta segunda função partilha-a em parte com a outra personagem mais destacada, esta feminina, quando nos vão narrando os acontecimentos à vez, cada um em seu capítulo, que dão corpo à história.
É um livro que nos vicia e não queremos largar.
Excelentemente escrito. É espantosa a forma como nos conduz de um episódio francamente humorístico e ligeiro a outro de pendor profundamente dramático.
Obra excessiva que não fez mais do que confirmar Agualusa como um dos meus (muitos, é verdade) autores favoritos de língua portuguesa.
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